10 abril 2020

PANDEMIA DO EGOÍSMO

Hoje eu fui dormir chorando. 

Deitei a cabeça no travesseiro e não pude expulsar da minha mente o invisível que me assusta. 

Tranquei a respiração para poder ouvir o som do silêncio
Tranquei a respiração para tentar organizar o caos descontruído aqui dentro. 
Para escutar com atenção o sono dos meus pais em constantes comuns

Silenciei até conseguir ouvir o cômodo ao lado descansar no breu, buscando constâncias na frequência respiratória que pudessem me acalmar dizendo que tudo está completamente normal

E torcendo para que continue assim. 
Torcendo para que de mim o invisível não tire o amor palpável. 

Enquanto meu coração acelerava numa ansiedade febril, meu corpo imóvel construía somente lágrimas. 

Lágrimas de um peito apertado que teme a pandemia do invisível. 
Teme aquilo que descrente o mundo tenta ignorar

Aquilo que estatisticamente não descongela corações feitos de pedra até que o calor dessa situação infernal queime a própria pele

Lágrimas geladas em noites de início de inverno onde a natureza naturalmente debilita deixando o mundo ainda mais vulnerável
Onde a preocupação dobra o tamanho. 

Lágrimas pela empatia, vacina não muito difundida. 

Hoje eu dormi chorando. 
Pelo maior inimigo da humanidade escondido no reflexo do espelho. 

Chorei pelo medo estampado no ato
Pelo descaso.
Pelos doentes anônimos
Pelo rosto conhecido que vai portar o tombo da realidade na consciência alheia. 
Pelo choro ao vento, pelo adendo de vários adeus não ditos
E pelos demais adeus encomendados pela imprudência dos céticos

Quantos rostos conhecidos vão ser necessários entrar na numerologia do caos para por fim levar a sério o terror instalado? 

Quantas cédulas na carteia serão realmente importantes quando a possibilidade de tocar o corpo frio de quem se amou em vida não for mais permitida? 

Hoje eu fui dormir chorando. 
Não só pelo gráfico que sobe na velocidade da luz. 
Mas pela pandemia do egoísmo.


#FIQUEEMCASA

2 comentários:

  1. Sua sensibilidade com as palavras é admirável.
    Poeme-se sempre que puder e ilumine almas de outrem.

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  2. Esplêndida profundidade em tuas palavras. Parabéns!!!!

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